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Rico Vasconcelos

10 metas de prevenção de HIV e outras infecções para 2019

Rico Vasconcelos

28/12/2018 04h00

Crédito: iStock

Final de ano é tempo de encerramento de ciclos e planejamento dos novos que se iniciam, em uma tentativa de contínuo aprimoramento. Nesse sentido, pensando em melhorar a habilidade das pessoas para lidar com questões relacionadas à prevenção de HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs –novo termo para as doenças sexualmente transmissíveis ou DSTs), faço aqui a sugestão de 10 metas para 2019 para todas as pessoas.

1. Use camisinha o máximo que você puder

A camisinha ainda é um dos principais pilares da prevenção e deve sempre fazer parte das alternativas de prevenção disponíveis. O Brasil bate recorde todos os anos em número de preservativos distribuídos gratuitamente. Segundo levantamento do Ministério da Saúde, cerca de metade dos brasileiros consegue usar o preservativo de maneira correta e constante nas suas relações sexuais com parcerias casuais. Para essas pessoas, o seu uso deve continuar sendo estimulado.

2. Reconheça suas vulnerabilidades

Todo mundo, ao longo da vida, vive diferentes contextos de vulnerabilidade ao HIV e às outras ISTs. Em alguns momentos, o risco de transmissão é maior e em outros, menor. Não existe nada de errado nisso desde que a percepção desse risco caminhe sempre junto com o risco real da ocorrência de uma dessas infecções. Para isso, cada pessoa precisa criar o hábito de pensar em como tem sido sua vida sexual e em que momentos está sob risco para cada uma das ISTs. Por exemplo, uma pessoa que pratica o sexo oral sem preservativo precisa saber que não deve ser o HIV a sua maior preocupação e sim as outras infecções. Enquanto uma pessoa que consegue usar o preservativo em quase todas as relações sexuais casuais com penetração, precisa saber que está vulnerável sim ao HIV nas vezes em que não usa. O que não se pode fazer é não pensar no assunto.

3. Encontre as estratégias de prevenção que funcionam para você

Sabemos que as pessoas não são iguais e, portanto, vão conseguir usar diferentes combinações de métodos de prevenção contra ISTs. Exatamente da mesma maneira que a escolha do método anticoncepcional, a escolha dos métodos de prevenção passa pelo que é considerado uma vida sexual de qualidade. Se a camisinha não atrapalha o sexo, ótimo. É só continuar usando. Mas, se ela acaba sendo deixada de lado às vezes, a associação das Profilaxias Pré ou Pós-Exposição ao HIV (PrEP e PEP, respectivamente) começa a se tornar interessante. As melhores estratégias de prevenção para um indivíduo são aquelas que ele escolhe usar, por entender como funcionam e por ser capaz de usá-las de maneira correta e constante. Encontre a combinação que funciona para você.

4. Crie uma rotina de testagem para as ISTs

Se você se infectou com uma IST, saiba que ela pode não causar nenhum sintoma por um longo período. Dessa maneira, a melhor coisa a se fazer é o diagnóstico dessa infecção e o tratamento adequado. Assim é possível evitar as possíveis complicações dessa IST e também impedir que ela seja transmitida para outras pessoas. Todas as pessoas que têm vida sexual ativa, e principalmente as que tem parcerias casuais, devem ter o hábito de se testar para as ISTs, como HIV, sífilis, hepatites virais, gonorreia e clamídia, no mínimo uma vez ao ano.

5. Leve a sífilis tão a sério quanto o HIV

Nos últimos anos os novos casos de sífilis estão aumentando em todo o mundo de maneira explosiva e, apesar disso, as pessoas na maioria das vezes não lembram nem se preocupam com essa IST, deixando toda a preocupação por conta do HIV. A sífilis é muito mais facilmente transmitida que o HIV numa relação sexual, inclusive no sexo oral. Em muitos casos não provoca nenhum sintoma em suas fases iniciais, mas pode causar sérios problemas ao feto quando a infecção ocorre em uma mulher grávida. Essa doença, no entanto, é facilmente diagnosticada com um teste rápido e sempre é curada com o tratamento antibiótico. Por isso, as pessoas precisam saber que não existe apenas HIV no mundo e que em muitas situações estão vulneráveis à sífilis. E também que quando esse assunto é gerenciado com testagem frequente e tratamento dos casos positivos, não irá causar problemas à saúde de ninguém.

6. Vacinação também é prevenção de ISTs

Estar com a carteira de vacinação atualizada é também uma maneira de se prevenir contra as ISTs. As vacinas que temos disponíveis para isso são as de HPV, Hepatite A e Hepatite B. Cada uma delas tem suas indicações específicas. Pegue sua carteirinha de vacinação e vá à Unidade Básica de Saúde mais próxima para descobrir se você precisa ainda tomar alguma dose.

7. Lute diariamente contra a Sorofobia

Sorofobia é o nome do sentimento de medo e rejeição ao HIV e às pessoas que vivem com HIV. Ela frequentemente aparece na forma de discriminação e estigma e é um dos maiores obstáculos existentes no mundo para que consigamos vencer a epidemia de HIV. A Sorofobia faz com que as pessoas não pensem sobre o assunto HIV ou, o que é ainda pior, pensem de maneira equivocada, preconceituosa e carregada de julgamento. Todas as pessoas do mundo são de alguma forma vulneráveis à infecção por HIV ou outra IST. E nenhuma dessas infecções acontece com uma pessoa como castigo por conta de alguma coisa errada que fez. Acontece apenas porque teve uma relação sexual, como todas as outras pessoas que têm vida sexual ativa. Hoje sabemos que uma pessoa que vive com HIV que faz seu tratamento de maneira correta e mantém sua carga viral indetectável, não desenvolverá nunca Aids, terá uma vida saudável e não transmitirá seu vírus por via sexual, mesmo que não use o preservativo. Assim, procure eliminar qualquer resquício de Sorofobia que ainda exista em sua cabeça. Ela, assim como todos os outros tipos de preconceito, é um sentimento irracional que causa sofrimento para outras pessoas.

8. Conheça a história da epidemia de HIV

O HIV tem os caminhos de sua epidemia muito mais determinados por fatores sociais do que por fatores biológicos ou virológicos. Todos os grupos populacionais que por algum motivo são socialmente excluídos têm pior acesso à saúde no seu conceito mais amplo, e por isso são automaticamente grupos vulnerabilizados à epidemia de HIV. Entender isso é fundamental para se entender aonde a epidemia está, para onde ela vai e, principalmente, aonde cada pessoa se insere nesse fenômeno. Entender toda essa dinâmica ajuda a compreender as origens da Sorofobia e melhora a capacidade individual de gerenciar suas vulnerabilidades e prevenção. Uma boa forma para se inteirar da história da epidemia de HIV são os muitos filmes e documentários produzidos ao longo das últimas décadas sobre o tema.

9. Não tenha medo de falar sobre o assunto HIV e ISTs

Vida sexual e sexualidade fazem parte da nossa existência no mundo. E junto com elas, as ISTs. Desde que os seres humanos surgiram sobre a terra temos registro da ocorrência dessas infecções entre nós. Assim, aprender a lidar com esse assunto de maneira franca e sem bloqueios é um bom caminho para se viver uma vida sexual com mais qualidade. Não deixe que os preconceitos e julgamentos deturpem aquilo que poderia ser simples e resolutivo. A ciência e a medicina se desenvolveram e melhoraram muito os meios que temos hoje para prevenção, diagnóstico e tratamento das ISTs. Se mantenha informado e tenha todos os benefícios disso.

10. Defenda os direitos já adquiridos e lute pelos próximos

O Brasil tem um papel central na história mundial do enfrentamento do HIV. A resposta brasileira a essa epidemia solidificou os princípios e diretrizes do SUS na década de 90 e serve até hoje de modelo para os demais países do mundo. Boa parte desse sucesso se deve à participação e envolvimento da sociedade civil que se articulou, lutou e conquistou a garantia dos direitos ao tratamento e à prevenção do HIV. O programa brasileiro de HIV, apesar de ser referência, não é perfeito e nem está automaticamente assegurado dentro do cenário político. Por isso, todos os cidadãos brasileiros devem estar atentos às políticas públicas desse programa, defendendo os direitos já adquiridos, lutando pela ampliação do acesso a eles e exigindo o aprimoramento do programa nacional conforme as novas tecnologias de prevenção e tratamento foram desenvolvidas. O controle da epidemia de HIV/Aids tem um impacto positivo e imediato na vida de todos os brasileiros. Se envolva nessa luta.

Sobre o autor

Médico Infectologista formado pela Faculdade de Medicina da USP, Rico Vasconcelos trabalha e estuda, desde 2007, sobre tratamento e prevenção do HIV e outras ISTs. É atualmente coordenador do SEAP HIV, o ambulatório especializado em HIV do Hospital das Clínicas da FMUSP, e vem participando de importantes estudos brasileiros de PrEP, como o iPrEX, Projeto PrEP Brasil, HPTN083 (PrEP injetável) e na implementação da PrEP no SUS. Está terminando seu doutorado na FMUSP e participa no processo de formação acadêmica de alunos de graduação e médicos residentes no Hospital das Clínicas. Também atua na difusão de informações dentro da temática de HIV e ISTs no Brasil, desenvolvendo atividades com ONGs, portais de comunicação, agências de notícias, seminários de educação comunitária e onde mais existir alguém que tenha vida sexual ativa e possua interesse em discutir, sem paranoias, como torná-la mais saudável.

Sobre o blog

Com uma abordagem moderna e isenta de moralismo sobre HIV e ISTs, dois assuntos que tradicionalmente são soterrados por tabus e preconceitos, Rico Vasconcelos pretende discutir aqui, de maneira leve e acessível, o que há de mais atual e embasado cientificamente circulando pelo mundo. Afinal, saber o que realmente importa sobre esse tema é o que torna uma pessoa capaz de gerenciar sua própria vulnerabilidade ao longo da vida sexual. Podendo assim encontrar as melhores maneiras para manter qualidade no sexo, e minimizar os prejuízos físicos e psicológicos associados ao HIV e ISTs.