Estigma relacionado ao HIV/Aids não diminuiu na última década
Em 2010, o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS) lançou o Plano 90-90-90 para controle da epidemia mundial de HIV.
Nela, haveria o compromisso de se diagnosticar em todo mundo 90% das pessoas que vivem com HIV, oferecer tratamento antirretroviral para 90% das diagnosticadas e alcançar a carga viral indetectável em 90% das tratadas até o ano de 2020, pois, assim, até 2030 os novos casos da infecção estariam controlados.
O plano pareceu bom na época, entretanto, havia uma quarta meta, além dos 3 noventas, que não foi levada a sério. Para atingirmos o sucesso no controle da epidemia teríamos também que zerar o estigma e a discriminação associados ao HIV/Aids.
De fato, esse estigma, nas suas diversas formas de sorofobia, ainda em 2019 é reconhecido como uma das principais barreiras para que indivíduos se vinculem às estratégias de prevenção e para que uma pessoa que vive com HIV acesse o serviço de saúde, mantenha sua doença controlada e, por fim, se mantenha com saúde e qualidade de vida.
A não priorização dessa última meta fez com que pouco de eficaz, em termos de ações e políticas públicas, tenha sido feito. Assim, como era de se esperar, estamos chegando ao final dessa década com a carga de estigma com o HIV muito parecida com a de 2010.
Isso é o que mostra um artigo publicado esse mês na revista científica Aids and Behavior. Nele são comparados os resultados de entrevistas realizadas em diferentes momentos da última década com cerca de 400 homens gays e bissexuais, maiores de 18 anos de idade, vivendo ou não com HIV, na cidade de San Francisco, nos Estados Unidos.
Os questionários foram realizados nos anos de 2011, 2014 e 2017, e tinham perguntas que avaliavam, entre outros aspectos, o estigma social em relação ao HIV percebido pelos entrevistados.
A análise dos resultados demonstrou que não houve no período redução da carga de estigma. E mais do que isso, foi identificado que esse estigma estava associado à depressão e a sentimentos de vergonha e baixa autoestima, reduzindo o engajamento dos participantes da pesquisa a uma rotina de cuidado da saúde, prevenção e tratamento.
No Brasil, não tínhamos até então dados sobre o tema, mas recentemente o escritório brasileiro do UNAIDS está realizando um grande trabalho para a avaliação das representações de estigma e discriminação relacionados com o HIV no país. Até o final de maio serão entrevistados mais de 2.000 indivíduos vivendo com HIV nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Porto Alegre, Manaus e Brasília.
Os resultados nos ajudarão a entender o impacto desse estigma na vida das pessoas e dará subsídios para a elaboração de políticas públicas de saúde voltadas para uma resposta efetiva contra o HIV/Aids.
É triste ver que numa década com tantos avanços tecnológicos e medicamentosos para o tratamento e a prevenção do HIV, não avançamos em nada no combate ao estigma e à discriminação. Afinal, não é com tecnologia nem com medicamentos que se melhora esse aspecto.
Estigma e discriminação aumentam a transmissão do HIV e as mortes por Aids. Sua redução requer o debate amplo e franco sobre saúde sexual e sexualidade, embasado cientificamente e realizado em todos níveis da sociedade, desde a escola até a vida adulta. Promovendo assim a conscientização e educação transformadoras. Sem isso nunca seremos capazes de virar o jogo e enfim alcançar o controle da epidemia mundial de HIV.
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